A desordem do Flamengo e o equilíbrio do futebol

Desde o famoso “pior ataque do mundo”, composto pelo trio Sávio, Romário e Edmundo, o Flamengo coleciona descompasos entre investimentos e resultados. O medo dos adversários diante de elencos aparentemente tão fortes acabou, por diversas vezes, não se concretizando em títulos para o time da gávea.

Alex Cabeção, Vampeta, Edmundo, Guerrero, Rodrigo Fabri…muita gente muito boa e que no Flamengo foram o puro suco de decepção. Ver um nome desses na escalação assustava mas na prática a coisa não era bem assim. E eis que chegamos em 2023: sete campeonatos e nenhum título.

O Flamengo, com elenco invejável e caro, perdeu mais uma final hoje. O São Paulo foi o time da vez a se aproveitar da desorganização rubro-negra. A Copa do Brasil 2023 fica no Morumbi. Mais do que merecido.

Alguém anotou a placa?

O líder da Série B do Brasileirão tomou de SEIS-A-ZERO. Faltam onze rodadas e temos basicamente ONZE postulantes para quatro vagas na Série A 2024.

O bom de um campeonato tão equilibrado é a emoção garantida – a despeito da qualidade técnica duvidosa que se vê em campo.

O ruim de um campeonato tão equilibrado é que muito difícil prever qualquer coisa. De jornalistas a apostadores, passsando por torcedores, patrocinadores, empresários e atletas, todo mundo gosta de prever minimamente e ter algum controle da situação.

A goleada aplicada pelo CRB no Vitória neste domingo deixou o time regatiano a três pontos do #G4. Entre ele o atual quarto colocado, Novorizontino, estão Atlético Goianiense, Criciúma, Juventude, Vila Nova. Atrás estão Ceará e Mirassol que ainda sonham.

A CBF escolheu esperar

A longa espera por Carlo Ancelotti valerá a pena? Tanta expectativa num ciclo até a próxima copa que será menor do que o dos rivais? Ainda tem o período de adaptação, afinal Ancelotti vai ter de entender que Pedro marcar três gols contra o Boa Vista de Saquarema não é lá grande coisa. Aguardemos.

O buraco do racismo

“Racismo contra Vini Jr. ‘ameaça’ alta da extrema direita em eleições na Espanha”, foi o título de uma matéria de O Globo ontem. Pois bem, o resultado das eleições não confirmou essa tendência. Quem sai como grande vencedor é o PP, que não é de extrema direita mas em muitos casos vai precisar dela para governar.

Uma matéria esclarecedora do Público mostra o novo xadrez regional da Espanha:
“As expectativas eram muitas entre os militantes do Partido Popular e a dimensão da vitória foi ampla. O objectivo inicial era ganhar em votos e tirar regiões e municípios aos socialistas, mas foi largamente ultrapassado pelos bons indicadores que foram chegando ao longo da noite”. E só pra finalizar, a mesma matéria diz sobre o lugar da extrema direita espanhola, aglomerada em grande parte no partido Vox, tem a partir de agora: “É precisamente o Vox que tem agora a chave nas autonomias e municípios onde o Partido Popular precisa de apoio para chegar à maioria. As próximas semanas serão de negociações intensas entre as duas formações sobre a extensão dos acordos e a divisão das pastas consoante a ponderação das duas forças.” Ah, a extrema direita é o lugar por excelência (mas não o único) dos racistas. A diferença é que lá eles se sentem confortáveis, com sofazinho, café quente e liberdade pra destrincharem suas ofensas.

Voltando ao caso Vini Jr: o buraco é bem mais em baixo. O peso das imagens e o poder de despertar o debate público sobre racismo nos estádios ainda precisa ser pensado junto a algo muito maior: racismo existe por todo canto, em diversos graus, e é inerente ao mundo em vivemos. Olha só esse mapa maroto:

Antes, uma pequena digressão sobre a pergunta principal dessa pesquisa: Esse tipo de questionamento direcionado a percepções e atitudes é muito mais valioso do que uma pergunta genérica do tipo “você é racista?”, que, geralmente, é respondida com um “não, claro que não”. São em questões práticas do tipo “você se incomodaria se sua filha namorasse um negro ou um árabe?” que percebemos a densidade da coisa.

E o que esse mapa nos traz? Primeiro que há lugares mais complicados do que a Espanha – inclusive os nossos patrícios aparecem numa escala mais avançada de racismo, segundo a pesquisa em questão. Segundo: países do leste europeu são muito diversos quanto à questão: a antiga Iugoslávia está num outro patamar comparada à antiga URSS. Terceiro: é muito difícil generalizar coisas desse tipo.

Uma coisa é certa: racismo precisa ser enfrentado. Colocar coisas pra debaixo do tapete não é uma solução legal, já dizem nosos amigos psicanalistas há um bom tempo. Do ponto de vista civilizatório, é uma luta cotidiana, em que os mais poderosos precisam dar sua parcela de contribuição (Alô, dona FIFA!). Nós também temos parcela nisso, como eu disse, no cotidiano: é hora de enfrentar o tiozão das piadas racistas. Racismo recreativo também é racismo.

Violência e crime organizado nos estádios

No último dia 15 tomou conta dos noticiários a informação de que áudios atribuídos a uma liderança da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) ordenavam o fim das brigas envolvendo torcidas organizadas de futebol. Dias antes, uma emboscada de membros da torcida organizada Mancha Verde contra a Gaviões da Fiel causara grandes danos, vários feridos e cenas chocantes. O que torna a veracidade dos áudios algo plausível foi o que se sucedeu: todas as grandes torcidas organizadas de São Paulo ordenaram o fim da violência física sob pena de punição.

O fato não é novo. Uma simples busca na internet revela inúmeras notícias do tipo: “Polícia Civil investiga possível ameaça do PCC a torcidas organizadas de SP” (dezembro de 2016) ou Acordo pela paz entre PCC e Comando Vermelho derruba homicídios em Fortaleza (agosto de 2016). A expansão territorial dos grupos criminosos e o controle social exercido por estes sobre a população é uma tendência cada vez mais comum.

O resultado disso é simples e cruel: um tipo de ordem social caracterizada por um poder paralelo, cujo grau de violência e medo o fazem mais temido, em diversas situações, do que o Estado e seu aparato de violência. Ou seja, o medo da violência policial ainda perde para o medo do crime organizado.

Além disso, diversos indícios apontam para a conexão entre tráfico de drogas e torcidas organizadas em várias cidades brasileiras. A facilidade de mobilizar e agenciar novos membros para o tráfico e a formação de agrupamentos que produzem identificação e pertencimento ajudam a entender esta conexão. Muitas torcidas organizadas se tornam, assim, uma das formas básicas do fenômeno das gangues à brasileira.

Há mais caroço nesse angu. Não é fácil nem simples entender tudo isso mas é urgente que se qualifique esse debate. No próximo texto vou tratar do que se vendeu e ainda se vende aqui na terra brasilis como solução e por que nenhuma delas funcionou.

Até a próxima!

 

Batistão, ontem.

Arbitragem tendenciosa, violência, sangue, choro e revolta.

Um suco de futebol brasileiro no estádio Batistão, em Aracaju, ontem à noite.

O Botafogo seria o segundo time da Série A a ser eliminiado na primeira fase da copa do Brasil 2023 (O Cuiabá inaugurou esta estatística) mas o árbirto Bráulio da Silva Machado, de Santa Catarina, fez uma lambança (intencional?) na adição de tempo além do que houvera comunicado.

Resultado: gol de empate do time carioca aos quase 55 minutos num jogo deveria ter sido encerrado aos 54.

Sergipe 1 x 1 Botafogo, salvo pelo gongo atrasado.

Memoráveis e lamentáveis cenas de brigas após o apito final com o presidente do clube sergipano partindo para cima do árbitro e um dos bandeirinhas agredindo o cartola com seu instrumento de trabalho.

O Botafogo enfrentará o Brasiliense na próxima fase.

E a CBF?

(um texto no padrão Cosme Rímoli)

Memes na velocidade da luz

Em meio à enxurrada de brincadeiras sobre o fiasco rubro-negro no Marrocos, não poderia faltar o Meia Hora. Sempre vejo as capas no perfil deles do Twitter mas essa eu recebi no grupo de telegram do bairro. A capilaridade das ações de compartilhamento de memes em redes sociais é a maior prova de sucesso do produto futebol. Essa medida já foi a das coversas de bar, de padaria – que ainda existem, obviamente – mas nada que se compare à velocidade com que uma brincadeira feita por um adolescente em Juiz de Fora chegue a um grupo de whatsapp de pescadores na Ilha do Marajó. Até as brincadeiras se globalizaram.

A pior Série B dos últimos tempos

06/02/2023. Em pouco mais de dois meses teremos mais uma edição do Brasileirão Série B. Os clubes negociam patrocínios e tentam montar seus elencos mas um detalhe chama a atenção: não se sabe onde serão transmitidas as partidas do campeonato. Globo, Sportv e Première ou SBT, Paramount e DAZN? Band? Facebook? Disney? Youtube? Cada uma dessas opções implica valores diferentas à hora de buscar quem financia a coisa toda. Ter uma partida transmitida na Globo em um sábado às 16h desperta interesses financeiros e alcança públicos diferentes do que um jornada esportiva em um canal da Twitch. Não confundir Twitch com Twitter.

O que se sabe até agora é que a grana será mais curta. Semana passada o UOL trouxe a seguinte manchete: TVs oferecem 60% menos por direitos da Série B e assustam clubes. Sem os grandes clubes na jogada, as vinte agremiações que entrarão em campo de abril a dezembro em busca de quatro vagas na Série A 2024 provavelmente investirão menos. Menos contratações de qualidade, menos interesse midiático, descaso da promotora do campeonato: este é o cenário que está sendo pintado. E para confirmar, a Copa do Nordeste já sofre um baque do clima de fim de feira na CBF: escondida em um streaming que ninguém ouviu falar, a lampions league se sustenta na paixão dos seus torcedores mas seguramente chegará a menos lares neste ano.

Futebol é negócio e entretenimento. Se faz com dinheiro e com público. Alguém não entendeu.

O treinador vindouro

O pachequismo e o vira-latismo estão em pé de guerra. Fernando Diniz ou Carlo Ancelotti? Vagner Mancini ou Guardiola? Givanildo ou Arsène Wenger? E o Abel Ferreira? As perguntas e comparações são muitas. O pós-fiasco da seleção brasileira no Catar reforçou o debate mais interminável dentre os mais intermináveis. Isso tudo misturado a análises comportamentais que cada uma das escolhas enseja: seu eu defendo Renato Gaúcho sou rotulado de nacionalista ufânico representante direto de José de Alencar. Se demonstro preferência por Thomas Tuchel sou um tupiniquim sem consciência que prefere Burger King aos sanduíches de rua.

Vicente Feola, primeiro treinador campeão do mundo com a seleção brasileira, ao centro, segura a taça Jules Rimet ladeado pelo goleiro Gilmar e pelo capitão do time, o zagueiro Bellini.

O grande problema de um debate como esse é a mistura fontes de identificação muito potentes: futebol, política e nação. Nas redes sociais, o selecionado que você escolhe torcer, quando da ausência do esquadrão brasileiro, costuma vir carregado de julgamentos alheios: não pode torcer pra país colonizador, não pode torcer pra país que viola os direitos humanos, não pode torcer pra país que tem gente racista. Aliás, aguardo indicação de um país que satisfaça tais critérios.

Voltando ao assunto indicado no título, temos o seguinte cenário: a escolha do futuro treinador da seleção brasileira é assunto de primeira ordem. O treinador da seleção, em condições normais de temperatura e pressão, tende a aparecer nos jornais tanto quanto o presidente da república. Em períodos de copa do mundo então! A trajetória em competições menores como copa das confederações, copa américa e eliminatórias é um constante vigiar e cornetar que tem seu clímax no momento da convocação para a copa do mundo: a repercussão da entrevista coletiva da convocação é um teste de popularidade e confiança que só uma reeleição para cargo político é capaz de superar. Uma copa do mundo é também momento de reafirmação de nacionalidade e de tradições. O orgulhoso brasileiro pentacampeão mundial teria capacidade de ceder a um modernismo tático do tipo tiki-taka e à presença de um técnico extrangeiro? Abrir mão do futebol ofensivo? Da ginga, do balacobaco, do ziriguidum? Para o cidadão comum isso talvez não seja um problema, mas para os entendidos, que somam algumas dezenas de milhões neste país, isso é quase uma briga de foice. Essas e outras escolhas passam pelo RH da CBF.